O governo de Vladimir Putin vai esperar uma comunicação oficial da proposta de paz para acabar com a Guerra da Ucrânia montada pelos Estados Unidos com ajuda de um enviado russo, que começou a ser alterada em negociações no domingo (23).
Participaram das conversas em Genebra americanos e ucranianos, que anunciaram sem detalhar haver “uma versão refinada” do acordo.
“Nós lemos a declaração de que alguns adendos foram feitos no texto que vimos antes. Vamos esperar. É algo muito importante para se guiar só por reportagens”, disse nesta segunda-feira (24) o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov.
Ele comentava os relatos de que houve mudanças favoráveis a Kiev em pelo menos 3 dos 28 pontos do acordo. “É necessário confiar em informações obtidas pelos canais oficiais”, completou.
Segundo diversos meios de comunicação americanos e ucranianos, o texto agora prevê um limite maior para as forças de Kiev, subindo o teto de 600 mil para 800 mil. O país invadido em 2022 também poderia, no futuro, juntar-se à aliança militar Otan, o que era vetado.
Além disso, teria sido retirado o reconhecimento das áreas ocupadas pelos russos e haveria negociação a partir da frente de batalha atual. O texto inicial falava em entrega de Donetsk e congelamento de linhas em Zaporíjia e Kherson. Nada disso está certo, contudo, como disse nesta segunda o premiê polonês, Donald Tusk.
“Nós continuamos a trabalhar com nossos parceiros, em especial os Estados Unidos, para buscar soluções de compromisso que nos fortaleçam, mas que não nos enfraqueçam“, afirmou o presidente da Ucrânia, Volodmir Zelenski, em uma videoconferência com representantes europeus reunidos na Suécia.
O governo de Donald Trump havia adotado o texto, elaborado pelo negociador ameicano Steve Witkoff e o enviado russo Kirill Dmitriev, após sua existência emergir em relatos anônimos na mídia na quinta passada (20).
O presidente americano deu até a próxima quinta (27), Dia de Ação de Graças nos EUA e Canadá, para que Zelenski topasse os termos pró-Rússia do acordo. Depois, sugeriu que o prazo poderia ser dilatado, mas também criticou a “ingratidão” do ucraniano e seus parceiros europeus.
Nesta manhã, ele voltou à rede Truth Social para comentar o assunto de forma críptica. “É realmente possível que um grande progresso esteja ocorrendo nas conversas de paz entre Rússia e Ucrânia??? Não acredite até ver, mas algo bom pode estar ocorrendo”, disse.
Observadores alemães, britânicos e franceses estiveram em Genebra. Os líderes de países aliados da Ucrânia afinaram o discurso ao longo do fim de semana, repetindo que a soberania de Kiev não poderia ser rifada e que Zelenski tinha de negociar pessoalmente os termos do acordo com Trump.
O encontro entre eles, segundo a mídia americana, pode ocorrer nesta semana ou na próxima, a depender do ritmo das conversas e da reação de Moscou.
O Kremlin está numa posição cômoda. Como a Folha mostrou no domingo, a linha-dura em torno de Putin trabalha para bombardear o documento, apesar de ele ser favorável aos russos na sua versão inicial com exceção do ponto em que prevê o uso de US$ 100 bilhões de reservas de Moscou congeladas no exterior pelas sanções para reconstruir a Ucrânia.
Como há uma disputa de poder interna e Dmitriev fez adversários no governo com sua proximidade de Witkoff e voluntarismo, Putin ao mesmo tempo reconheceu ter sido informado pelos EUA do texto, mas afastou-se de sua paternidade.
Assim, se o esforço de Trump novamente fracassar, como já ocorreu antes, o russo poderá dizer ao público doméstico que apenas rejeitou uma proposta que não atendia suas demandas maximalistas. A linha-dura seria recompensada, pois trabalha com a ideia de que a Ucrânia ainda pode colapsar.
Isso ocorreria, na visão dessa ala ligada aos militares e aos serviços de segurança, com a confirmação dos avanços no campo de batalha enquanto Zelenski enfrenta um grave escândalo de corrupção no governo.
Nesta segunda, o Ministério da Defesa russo anunciou a tomada de mais uma vila na região de Zaporíjia (sul) e o controle de dois outros setores de Pokrovsk, vital centro logístico ucraniano em Donetsk (leste), que está sendo defendido prédio a prédio por Kiev. Em Kharkiv (norte), quatro pessoas morreram atingidas por drones.
Na mão contrária, um ataque com drones mirando Moscou forçou o fechamento de dois aeroportos da capital, que já foram reabertos e estão com atrasos nos voos. Eles foram derrubados, segundo o governo regional.
Central na equação é Trump. A Europa dá apoio diplomático a Zelenski, mas se os EUA fecharem a torneira no fornecimento de inteligência como imagem de satélites e cortarem o fornecimento de armas, mesmo via Otan, Kiev estará em apuros.




