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Chile vai às urnas após debates fracos e fake news – 15/11/2025 – Sylvia Colombo

O Chile já teve campanhas presidenciais muito mais densas do que a de 2025. Nos ciclos de Michelle Bachelet, discutia-se ampliação do Estado de bem-estar, reforma tributária, igualdade de gênero e modernização do sistema educacional. Nas disputas vencidas por Sebastián Piñera, o foco era crescimento, inovação, eficiência estatal e competitividade, num país que se via como caso singular na região.

O período posterior ao “estallido social” (protestos em massa) de 2019, embora tenso e contraditório, iniciou debate inédito sobre pensões, saúde, transporte, educação, modelo econômico e desenho institucional. Era um momento em que a política chilena buscava responder ao mal-estar acumulado e discutia qual país se queria construir.

Esse histórico contrasta com a campanha atual, marcada por uma pobreza de ideias que chama atenção em uma sociedade acostumada a discutir políticas públicas de forma mais profunda.

As semanas recentes foram dominadas por promessas de efeito e soluções impossíveis de aplicar. A oferta eleitoral se concentra em drones, cercas, cárceres flutuantes, expulsões massivas e ameaças de rompimento diplomático, como se segurança fosse o único tema relevante da vida pública chilena.

Todas as principais pesquisas, como Cadem, Criteria, Pulso Ciudadano e B&W, indicam que a criminalidade aparece como a maior preocupação da população, apesar de o Chile continuar entre os países com menores taxas de homicídio da América Latina e exibir indicadores macroeconômicos superiores aos de seus vizinhos. A distância entre a realidade objetiva e a percepção que domina o debate eleitoral é talvez o traço mais marcante desta disputa.

Outro elemento central é a fragmentação da direita. José Antonio Kast, que até poucos meses atrás figurava como presença certa no segundo turno, registra queda nas pesquisas de forma consistente, embora deva passar à etapa final da disputa.

Parte de seu eleitorado, porém, tem migrado para Johannes Kaiser, que adotou uma retórica mais dura; enquanto há uma outra parte que se aproxima de Evelyn Matthei; e Franco Parisi —com seu forte discurso anti-imigração— volta a aparecer com números competitivos, algo inesperado no início da corrida.

A única constante é Jeannette Jara, que lidera o primeiro turno na maioria dos levantamentos. O retorno do voto obrigatório adiciona incerteza: em 2021, apenas metade do eleitorado participou; agora se espera comparecimento muito maior, o que pode provocar surpresas e punir candidatos que apresentam propostas irrealizáveis.

O empobrecimento da campanha não reflete o país. O Chile mantém instituições sólidas, estabilidade macroeconômica e tradição democrática. Também conserva um eleitorado moderado, que costuma atuar como freio a posicionamentos extremos, como ocorreu nas eleições presidenciais de 2017 e de 2021 e nos dois plebiscitos constitucionais, em 2022 e 2023.

O contraste entre esse Chile real e o Chile imaginado pelo discurso eleitoral evidencia o quanto o debate público se degradou sob influência do medo, do ruído digital e da simplificação.

O país que vai às urnas neste domingo (16) não é o país descrito pelos slogans. Resta saber se a votação reconectará a política chilena com sua história recente de debates mais sérios e com a disposição de enfrentar seus desafios reais, não fantasmas amplificados pela campanha.


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Fonte: Folha de São Paulo

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